Gosto de pensar que é a partir do encontro com o Outro, que nos organizamos, nos reconhecemos e nos sentimos na possibilidade de avançar. Nos encontramos com a gente mesmo, a partir do encontro com o Outro. E cada encontro é inédito.
Gosto de entender o diálogo de forma mais ampla do que a sua própria origem grega: por meio da palavra. Gosto de perceber como a capacidade de um sistema em se ver plenamente, entendendo seus padrões, suposições e interesses. O diálogo é um lugar único, de paciência, de trocas, de humildade e de aprendizado constante, que circula entre todas as vertentes da comunicação verbal e não verbal, incluindo aqui as emoções.
Assim, a possibilidade de liderar mudanças profundas – que é um dos papéis fundamentais do Mediador, tem pouco a ver com conduzir a mudança no Outro. O foco deve estar centrado na melhoria dos relacionamentos com o todo, que possibilitará, desta maneira, a comunicação fluída.
Para isto acontecer, deve-se mudar o modo de ouvir, de escutar. E mudar a maneira como se escuta, significa mudar a maneira como experimenta os relacionamentos e o mundo. Mudando isso você muda TUDO.
À medida que você se aprofunda na escuta, melhora a sua qualidade e assim, vai moldando o desenrolar da conversa. E isto é percebido por todos os envolvidos. Assim a própria conversa e os relacionamentos se dirigem para patamares mais profundos, que é o lugar onde as coisas acontecem e os interesses são revelados. E para encontrar o real e legítimo interesse, devemos abandonar tudo aquilo que não é essencial e não está à serviço destes relacionamentos.
O medo, a exclusão, os julgamentos, a ausência de respeito e a incapacidade de perceber, são os grandes limitadores da boa escuta. E tudo isto tem relação direta com as nossas próprias necessidades não atendidas. As avaliações e julgamentos que fazemos está mais ligada com os nossos conceitos de certo e errado do que qualquer outra coisa. E o medo está aí porque, ao escutarmos, corremos o risco de mudar aquilo que acreditamos. Já pensou nisso?
Para mim, Mediador, nada pode ser mais lindo do que esta ideia de que a escuta é o encontro com o Outro.
Escutar é acolher. É coletar os afetos e partilhar, devolver mais e com mais significado. O bom escutador tem de estar profundamente conectado ao instante presente e ao Outro para poder absorver tudo o que lhe é entregue muitas vezes sem a intenção declarada de ser entregue.
Escutar é ter curiosidade. Curiosidade é cura e, tem a ver com o futuro, que se manifesta a partir do presente que é moldado por aquilo que está pronto a emergir. Aprender com o passado e com as experiências vividas é necessário, mas não é suficiente. Precisamos de mais: do presente e da curiosidade pelo futuro.
Para escutar o Outro é necessário estar presente por inteiro e receber aquilo que lhe é entregue com dignidade, respeito, honestidade e principalmente sem qualquer tipo de julgamento, escutando realmente o que o Outro diz.
A escuta não se limita à audição, tem a ver com todos os sentidos e percepções ao mesmo tempo.
Perguntar é a chave para poder escutar as boas respostas para serem escutadas.
Devemos nos esvaziar para o encontro. Esvaziar para a escuta e a partir do que nos é trazido, construir. Juntos.
Escutar é um ato de amor. Um ato de entrega. Desprovido do nosso ego em direção ao eco (do sistema) ao qual estou à serviço.
O Mediador existe em relação.
A escuta é o meio mais privilegiado pelo qual construímos experiências de intimidade. E intimidade não acontece quando gostamos das mesmas coisas, consumimos os mesmos objetos ou temos traços de personalidades e gostos em comum. Intimidade acontece quando compartilhamos dúvidas, incertezas, crises e diferenças.
Intimidade é a experiência da diferença.
Escutar tem a ver com mudar o nosso tamanho, nossa pequenez com relação ao todo, o grão de areia na praia, e encarar as coisas de frente, com coragem, sem medo da verdade daquilo que vamos escutar, permitindo que venha aquilo que deve surgir, mesmo que seja diferente dos seus valores e crenças. É estar aberto ao universo e ao Outro.
A escuta é uma consciência constante do fato de que nossos interesses não são os interesses de todos ou do Outro, muito menos nossas necessidades, e que devemos estar abertos a isto. Verdadeiramente. Com legitimidade. A escuta expande nossos entendimentos e nos leva a novas experiências que jamais poderíamos sequer imaginar.
Escutar com qualidade é algo que se desenvolve e se aprende com a prática contínua e curiosidade pelo Outro, pela diversidade e pela inclusão, mas, principalmente, pela abertura para a experimentação.
E a arte na escuta do Outro começa pela possibilidade de escuta de si mesmo.
Experimente este movimento de escuta verdadeira. Com você. Na sua casa. Na sua empresa. Em todas as suas relações. Ele é revelador e transformador.
E eu, estarei aqui para te escutar. Se você precisar.
Muitos dos conceitos e frases deste texto, foram extraídos e/ou adaptados de diversas passagens de livros, aulas, cursos e conversas experimentadas por mim.
Alguns livros de referência
Da imagem utilizada – obra do Famo, artista contemporâneo que sigo no Instagram @famoisdead. Com trabalhos que são altamente influenciados pela cultura pop, assim como por artistas que ele admira, como Basquiat, Warhol e Twombly, juntamente com os movimentos nos quais eles criaram ou participaram. Famo usa figuras do nosso coditiano infantil para se expressar. Do texto na imagem:
“Communicate with me and lets build a story together”, ou seja, em português, em tradução livre, “Comunique-se comigo e vamos construir uma História juntos.”
JOSÉ MANGINI é parceiro da ALGI Mediação. Advogado, Jornalista e Mediador certificado pelo ICFML, Secretário-Geral da Comissão da Advocacia na Mediação e Conciliação da OAB/SP e pós-graduado em Métodos Adequados de Resolução de Conflitos Humanos, pela ESA/OAB/SP. Atua na Mediação privada nas áreas empresarial e familiar. É Mediador certificado pelo CNJ onde atua junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Um escutador em exercício e desenvolvimento.