O casal que viajou de bicicleta o Mundo inteiro por 3 anos e meio conta as mudanças de percepção e relacionamento com a cidade.
Estamos juntos há 14 anos “brutos” e casados há uns 6. A gente sabia que a nossa relação era muito boa, madura e com muita troca. Durante a viagem, tínhamos as nossas discussões, mas elas se tornaram muito práticas e objetivas. Não tinha o ficar putinho no quarto, porque não tinha o quarto… O máximo que acontecia era pedalar um pouco a frente sem conversar. Quando ia rolar uma discussão, acontecia alguma coisa ou alguém cruzava o nosso caminho e a gente esquecia.
André: Numa exposição do fotógrafo Cartier Bresson, fui a lojinha do Sesc e vi um livro do Argus Caruso, um arquiteto mineiro que tinha completado a volta ao Mundo em bike. Este livro foi a faísca, foi o que me apresentou para viajar desta forma. Comprei o livro e por um mês fiquei estudando na internet como fazer esta viagem. A gente sabia que a viagem iria durar entre 3 e 4 anos.
Karla: Na volta, quando chegamos em São Paulo, eu queria ficar na rua, eu não queria voltar para dentro de casa, me trancar. Queríamos continuar vendo pessoas, conhecendo pessoas. Hoje a gente não sai mais da rua, saímos sempre à noite para dar uma volta. Hoje, eu sinto a cidade um pouco mais humana em alguns aspectos, é legal ver o pessoal andando de bike, é legal ver um pai ou uma mãe levando o filho para a escola numa garupa, a criançada de patinete, de skate… Tudo isso é muito positivo. Antes de viajar, eu estava esgotada da cidade. Não aguentava mais não cumprimentar niguém na rua, ou cumprimentar e a pessoa não me retornar. Até vizinho entra no elevador comigo e fica olhando para baixo, para os lados e não fala comigo. Voltar para São Paulo depois da viagem, me fez voltar cumprimentando e não mais dando bola se a pessoa retorna ou não. Eu não vou mudar.
André: Nesses 3 anos e meio, a cidade mudou, o cidadão mudou e a gente também mudou. A gente tem aproveitado mais o que ela oferece. A viagem mudou muito o lance de conhecer pessoas, querer ficar com pessoas, de ver idéias diferentes, pessoas que agregam, que querem fazer coletivamente.
Karla: Durante a viagem, o contato humano era essencial. Como a gente não fazia planos, as vezes íamos ficar dois, três dias em uma cidade e ficávamos duas semanas por causa das pessoas, pela vibe, pelo lugarzinho. Hoje a gente não se permite mais entrar para o sistema. Antes da viagem, eu tinha de trabalhar de segunda a sábado. Não podia fugir daquilo porque tinha contas a pagar, Hoje, reduzi meu custo. Não me importo mais em não fazer parte da academia bonita da cidade. Subo escadas, aproveito de uma outra maneira que me deixa mais feliz.
André: Eu falaria para o Prefeito que algumas das iniciativas dele estão legais. As ciclofaixas não estão perfeitas, mas é um começo. Tem muito a melhorar, mas agradeceria pelo o que tem sido feito. Poderia revitalizar o Centro. Não tenho partido. São idéias somente. Fizemos 570 “pedais” nestes 40 países que viajamos. Me incomoda muito aqui, esse negócio da pessoa se trancar em casa porque fora está perigoso. Mas por que lá fora está perigoso? Tá perigoso porque não tem ninguém na rua! Vamos inibir essa galera do mal! Se você está na rua, o bandido não tem espaço.
Karla: E eu diria para o Prefeito que mais ruas fossem fechadas só para pedestres. Ao invés das pessoas ficarem fechadas em suas casas, com as ruas abandonadas, que elas pudessem usar mais as ruas. Ficaria até mais seguro. Quanto mais as pessoas usam as ruas, melhor a cidade fica.
André e Karla Cherri. Ele veio para São Paulo de Ribeirão Preto um ano antes dela, que nasceu em Franca. O André morou em vários bairros antes da Karla chegar: Liberdade, Itaim e Vila Mariana. Os dois vieram com oportunidades de trabalho: ele na Nossa Caixa e ela no Habib’s. Estão aqui há mais ou menos 9 anos. Destes, ficaram 3 anos e cinco meses viajando o Mundo de bicicleta. Conheceram 40 países e inúmeras pessoas. O plano agora é uma nova viagem.
André e Karla: Facebook | Vimeo
Zé Mangini.
Amei isso. Sempre procurei esse estilo de vida. De sonho gostaria de agregar o pedal aos meus atendimentos. E gostaria de conhecer e experimentar muitos lugares. Confesso que meu adversário ainda é um inverno rigoroso.
Oi Camilla, que bacana! O André e a Karla são duas pessoas maravilhosas, segue o link deles para vocês conversarem sobre esta paixão:https://www.facebook.com/BikesAndSpices/