Tive uma adolescência muito bacana. Muitos amigos do clube, bons amigos do bairro, boas festas, garotas, um pouco de tudo o que se permitia na época e de algumas coisas que não se permitiam também. Inverno em Campos do Jordão, verão nas praias do Guarujá e de Ubatuba. Estudei no Bandeirantes e depois no Rio Branco. Bons colégios de São Paulo. Entrei cedo na faculdade de Direito da PUC e tive de trancar por causa do Exército.
Hoje, pensando, tenho a certeza de que muito foi possível por eu ter nascido em uma família grande, com 8 irmãos, que além de eu conviver com todos eles mais velhos do que eu, meus pais nunca tiveram tempo para prestar atenção em mim e nas coisas que eu fazia. Tem também um pouco do jeito que todos nós fomos criados: cada um por si e todos se ajudando quando era necessário. Isso é assim até hoje. E é bom, porque não fica pesado para ninguém.
Quando meu pai ficou doente com Alzheimer e depois um câncer, todos se revezavam nas visitas e cuidados. Tinha sempre uma irmã ou outra mais por perto, cuidando do dia-a-dia da casa do meu pai e das cuidadoras, e os outros irmãos se revezavam nos plantões e companhia para o velho Manginão. Tenho boas lembranças destes anos e destes plantões. Eram finais de semana em que eu ficava com meu pai contando Histórias. Às vezes, a mesma História por horas seguidas. Coisas do Alzheimer. Mas eu não me importava. Até gostava de mudar a versão para exercitar.
Meu pai, apesar de ter sido um cara bastante egoísta e mimado, era um cara legal e carinhoso com os filhos. Sempre disposto a um abraço, um beijo ou um afago. A única vez que ele tentou me dar um tapa, abaixei e ele espatifou a mão na parede, espetando em um prego e furando a palma da mão. Deve ter doído pacas. Nele. Eu saí correndo e rindo.
Nas minha baladas, sempre bebi muito. E naquela época, não existia a cultura do “Se beber, não dirija.”. Nem a cultura do “Vá de táxi”, nem a cultura das batidas policiais, nem a fábrica de multas e de limites de velocidade. E eu, bebia e dirigia. Muito. Muito rápido. Muito intensamente como qualquer jovem faria. E sempre bati muitos carros. E todas vezes que bati carro, tinha bebido e estava em alguma velocidade incompatível com o meu estado. Aliás a função dos jovens é estarem em velocidades incompatíveis.
Eu e meu irmão mais próximo, tínhamos um carro, um Fuscão amarelo, que eu bati. Meu pai tinha um Ford Corcel dourado, que eu bati, uma Caravan vinho, que eu bati. Minha step mother, tinha um Passat vermelho, que eu bati, depois algum outro carro, que eu bati também. O pai da minha namorada da época tinha um Scort azul, que eu bati. Meus irmão não me emprestavam os seus carros, porque eu batia. Mas em todas estas batidas, eu nunca ouvi uma bronca do meu pai. Ele sempre estava preocupado com o meu estado ou tentando me acolher naquela situação. E sempre tive de pagar pelo estragos que causei. Custasse o que custasse.
Hoje em dia, todas as coisas estão mais regradas. Não se pode mais beber e dirigir, não se pode mais andar acima do limite de velocidade. Tudo e todos são mais responsáveis e tomam cuidados nas ruas. E quem não é, sofre ou deve sofrer as conseqüências. Tudo certo. Eu fiquei mais velho e meu pai já morreu.
Os acidentes diminuíram drasticamente e muitas vidas foram salvas em São Paulo ao se implementar os limites de velocidade atuais nas vias expressas e nas principais ruas da cidade. Vemos notícias de outras cidades como Nova Iorque ou Londres implementando limites de velocidades mais baixos do que os nossos. Por outro lado, vemos alguns candidatos a prefeitura e vereadores tendo como plataforma de campanha o aumento da velocidade nestas vias. Um retrocesso. Se qualquer vida foi salva ou acidente evitado, já deveria valer. Menos álcool, menos velocidade, menos acidente, menos mortes. Poderia ter menos multas e mais educação no trânsito. Assim todos aprenderiam e o respeito não seria apenas pelo medo ou pelo bolso. Não se deve voltar atrás. Não devemos deixar esses nossos candidatos fazerem esta bobagem. E eu posso falar isso porque, por sorte, não morri e nem matei no trânsito, mas meu anjo da guarda está cansado até hoje.
Bom voto com velocidade compatível para vocês !
Zé Mangini nos carrinhos do Sammy